A adultização, termo recém utilizado e debatido no Brasil, virou tema de debate entre especialistas na área de saúde, durante o podcast Saúde360, do Bahia Notícias, nesta terça-feira (26). Em entrevista ao programa, a psicóloga Ana Paula Pitiá e a ginecologista Patrícia Almeida discorreram acerca da exposição de crianças e adolescentes a comportamentos, conteúdos e responsabilidades direcionadas a adultos, antes do momento adequado para a idade.
O assunto obteve repercussão após o humorista Felca publicar um vídeo, no último dia 9, denunciando o influenciador Hytalo Santos por exploração infanto-juvenil. Na ocasião, Felca alertou para riscos de exposição infantil na web.
Após a denúncia, a gravação mobilizou a classe política, especialistas, famílias, autoridades e organizações da sociedade civil em torno da aprovação de uma legislação protetiva para crianças e adolescentes na internet.
A ginecologista Patrícia Almeida comentou a respeito da hipersexualização infantil, a importância da conversa e educação para prevenir problemas e a necessidade de atenção e cuidado com o corpo.
“É muito triste vermos essa adultização. A gente vê desfilar no consultório meninas muito novinhas, extremamente adultizadas, falas deste tipo. Acho que o grande cuidado é não colocar essa menina ou menino que chega ao consultório com a hipersexualização que ela psiquicamente não dá conta do que vem. Muitas vezes, ela está ali numa faixa etária que não é compatível. […] Assim a gente já se fala muito quando um bebê é vacinado para hepatite B na infância é para prevenir uma infecção sexualmente transmissível”, contou Almeida.
“Essa atenção é voltada para o cuidado com o próprio corpo, e essa conversa franca, é o que pode prevenir. É o que pode ajudar nessa conversa franca e clara mesmo, com quem está em formação”, explicou.
A especialista da área de saúde, exemplificou ainda sobre a hipersexualização com brincadeiras infantil. “É até aquela brincadeirinha que você tinha antes e que hoje se fala tanto assim. A criança é namorada de outra. Porque isso começa nessa brincadeirinha, em tese inocente, mas que começa dessa forma.
Às vezes uma roupa muito justa que toca o clitóris de uma menina, ela vai se sentir erotizada, ela vai gostar daquele toque naquele momento, porque tocar o clítoris em qualquer idade dará prazer a ela. Antes, talvez até inconscientemente, a roupa das meninas era uma roupa mais leve, era a calcinha mais solta”, considerou.
“Muitas vezes a fala, algo que a gente vinha comentando, nem tudo você precisa dizer para as outras. Até o excesso de intimidade, muitas vezes, a criança estar ciente de atos sexuais que a minhã e o pai praticam, é preciso que isso seja intimo e separado para cada faixa etária. Acho que a gente precisa ter um certo cuidado” indicou.
Já a psicóloga Ana Paula observou a importância do papel dos pais em orientar e refletir sobre o contexto em que as crianças estão inseridas, mencionando que elas apenas reproduzem o que aprendem. A profissional apontou a necessidade de discutir cultura e estruturas familiares para entender a adultização, e como as famílias podem não filtrar influências externas prejudiciais.
“O papel dos pais é orientar, é conversar, mas acredito que também é refletir sobre o próprio contexto que eles estão inseridos, pois se a criança dança, faz determinadas coreografias, quem está ensinando e incentivando? De onde é que vem isso? Essa reflexão, acho que é uma coisa também importante. Ela [a criança] só reproduz. A criança se veste de forma adultizada, quem é que compra? Quem é que veste? Como é essa dinâmica? Precisamos discutir cultura, estruturas de família e uma série de coisas. Está posto que para o desenvolvimento daquele adolescente isso é prejudicial, disfuncional e atrapalha uma série de aspectos emocionais e do desenvolvimento. Tem uma macro-autoridade social em que as famílias estão imersas e esses pais acabam não filtrando”, afirmou.
A psicóloga complementou que a sociedade precisa alertar, educar e fazer as famílias refletirem sobre seus próprios comportamentos, citando músicas e roupas como exemplos. Ela destacou que a reflexão sobre esses comportamentos é crucial para interromper esse ciclo.
“Enquanto sociedade, estamos alertando, educando e chamando atenção e fazendo a sociedade e as famílias refletirem sobre os próprios comportamentos. Então, enquanto as famílias não estiverem atentas ao que elas estão transmitindo para as suas crianças, de que forma elas estão encorajando determinados comportamentos, a gente não muda. Acho que o exemplo são as músicas e as roupas. Se ela está dançando, quem está colocando a criança para dançar? Tem uma série de fatores que precisam desse nível de relação e de responsabilização das famílias”, concluiu.