Setembro Amarelo é a campanha dedicada à prevenção da vida. A conscientização tem ganhado visibilidade nos últimos anos no Brasil, mas, apesar dos avanços nesse sentido, os números relacionados aos transtornos mentais ainda são alarmantes, revelando que a discussão precisa ir além deste mês.Nesse contexto, surge uma questão central: o que ainda falta ser feito no âmbito das políticas públicas para que a saúde mental seja tratada como prioridade permanente e não apenas como pauta pontual?Para efetivar as discussões em torno do Setembro Amarelo, uma das maneiras de conscientizar a população acerca desse tema é por meio de políticas públicas com enfoque na elaboração de ações práticas.

A entrevista a seguir, realizada com Carolina Dórea, psicóloga e coordenadora da Atenção Psicossocial da Secretaria Municipal de Saúde, busca aprofundar essa reflexão, analisando as lacunas existentes, os desafios na implementação de políticas efetivas e os caminhos possíveis para fortalecer a rede de apoio e cuidado à saúde mental no Brasil.

Confira a entrevista:Como fazer para que o debate sobre suicídio e saúde mental não fique restrito apenas ao mês de setembro?

1-É muito importante que a imprensa e a sociedade em geral abram espaços de visibilidade às campanhas educativas e de promoção à saúde durante todo o ano. É necessário que tenhamos uma abordagem contínua e integrada em todos as camadas sociais. Campanhas anuais, como o “Setembro Amarelo”, podem favorecer à conscientização, mas o objetivo é que os materiais e as discussões sejam aproveitados de setembro a setembro, de janeiro a janeiro. A prevenção do suicídio requer uma ação coletiva contínua.

Essas estratégias sobre a temática ao longo do ano envolvem promoção da saúde com combate a estigmas em torno da saúde mental, como também a educação acerca de suas determinações sociais, combatendo preconceitos de raça/etnia, gênero e sexualidade, por exemplo.

  1. Quais estratégias de comunicação podem ser adotadas pelos veículos e sociedade para o tema permanecer em pauta durante o ano todo?

Diversas estratégias podem ser adotadas para manter o tema em pauta de forma contínua e responsável. Por exemplo, o suicídio e outras violências autoprovocadas devem ser tratados como problemas de saúde pública, com abordagem séria e não sensacionalista. Devem ser evitados termos que possam romantizar ou simplificar esses atos. Em geral é recomendado evitar a divulgação de métodos e locais do suicídio, pois ajuda a prevenir o que chamamos de “efeito de contágio”. É importante educar a população para desmistificar o tema e reduzir os estigmas sobre suicídio, incluindo outros temas de saúde mental, fortalecendo a compreensão do fenômeno por meio de dados epidemiológicos, combatendo preconceitos. Além disso, podem-se divulgar estratégias de enfrentamento e informações sobre onde buscar ajuda no Sistema Único de Saúde. Essa também pode ser uma estratégia poderosa, buscando acolhimento e escuta em Unidades Básicas de Saúde e em Centros de Atenção Psicossocial. A colaboração com a imprensa é fundamental para uma cobertura responsável de eventos com monitoramento de conteúdos. A mídia precisa se entender obrigada a tratar desses assuntos de forma socialmente adequada e responsável.

  1. Como contribuir para abordar sobre saúde mental de forma responsável e contínua?

Essa abordagem envolve encorajar as pessoas a falarem mais sobre seus sentimentos, podendo buscar acolhimento e ajuda, desmistificando a ideia de que a saúde mental é um tabu. Além disso, precisamos incentivar a prática de atitudes e hábitos de vida que melhoram o bem-estar no dia a dia, como atividade física, alimentação saudável, sono adequado e momentos de prazer. Precisamos reconhecer o ser humano como social, valorizando nossa conexão com outras pessoas, fortalecendo o apoio mútuo em nossa sociedade.

  1. As escolas, empresas e comunidades podem criar ambientes mais saudáveis mentalmente, mas como fazer isso?

Não há receita pronta da saúde para todas as questões sociais que envolvem a temática nesses ambientes. Contudo, materiais da OPAS/OMS recomendam que nas escolas podem ser implementados projetos e programas de desenvolvimento de habilidades socioemocionais, promovendo educação para a vida, buscando resolução de problemas, com reconhecimento e manejo do estresse, em vez de focar explicitamente no suicídio.Professores e outros profissionais escolares precisam estar capacitados para criar um ambiente de apoio, reconhecer fatores de risco e sinais de alerta, oferecer suporte e fazer encaminhamentos adequados. A família precisa se envolver mais com o ambiente escolar, estando mais próximos para fortalecer o ambiente escolar nessas práticas que favoreçam e fortaleçam os laços sociais e comunitários.

Já nas empresas, temos a recente NR1, do Ministério do Trabalho e Emprego, que foca na prevenção de riscos psicossociais nas organizações, e isso também envolve prevenção às violências autoprovocadas, reduzindo fatores de risco ocupacionais e minimizando estressores relacionados ao trabalho.

  1. Como familiares e amigos precisam agir em relação à escuta ativa e ao apoio para uma pessoa que precise destes cuidados durante o ano inteiro?

Ter empatia e escuta atenta, com mais aceitação, evitando julgamentos, para que a pessoa se expresse livremente. Se suspeitar de risco, é importante perguntar diretamente sobre possíveis pensamentos suicidas de forma acolhedora e cautelosa. Ações mais empáticas podem ajudar a aliviar a tensão e permitir que a pessoa peça ajuda. Já em momentos de crise, a pessoa não deve ser deixada sozinha. É importante incentivar a companhia de alguém de confiança até que ela seja atendida por um profissional.Uma orientação é não tentar resolver o problema sozinho. Procure ajuda para tratamento; comunique-se com familiares ou amigos de sua confiança.

  1. De que forma campanhas anuais governamentais da Secretaria podem ser transformadas em programas permanentes?

O cuidado à saúde é feito em rede e em diálogo com a sociedade. Para isso é preciso fortalecer a articulação de todos os pontos e contar com maior participação social, com protagonismo cidadão em todo o processo. Sobretudo para criar e fortalecer investimento em políticas públicas que impactem no bem-estar social e econômico, e não apenas focar em políticas de saúde. 

  1. Qual a importância de falar de saúde mental no cotidiano, sem esperar uma crise ou tragédia para agir?

Primeiro reconhecer que o suicídio é evitável. Segundo, abordar o tema continuamente para permitir a identificação precoce de pessoas em risco, antes que a situação se agrave. Vamos naturalizar o debate sobre saúde mental no cotidiano para reduzir o estigma e os tabus. A prevenção do suicídio e a promoção da saúde mental precisam de esforço contínuo e requer a responsabilidade de toda a sociedade.Centro de Valorização da Vida

Centro de Valorização da Vida realiza apoio emocional e prevenção do suicídio, atendendo voluntária e gratuitamente todas as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo, por telefone, e-mail e chat 24 horas, todos os dias.

Ao ligar para o número 188, é possível ser atendido por um voluntário, com respeito, anonimato, que guardará estrito sigilo sobre tudo que for dito. Os voluntários são treinados para conversar com todas as pessoas que procuram ajuda e apoio emocional.Atendimento gratuito

Para buscar apoio através de atendimento com profissionais de saúde mental, de forma gratuita, na capital baiana, basta recorrer aos serviços oferecidos pela prefeitura de Salvador, por meio da Secretaria Municipal de Saúde (SMS). Atualmente, o município, através da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), dispõe de vários pontos de atenção à saúde mental que desempenham uma função muito importante referente à valorização da vida.

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